[Análise] Mafia 2

Enquanto somos pequenos, ensinam-nos a ser educados, correctos e a não dizer palavrões. Da mesma forma, ensinam-nos que a violência, a injustiça e a discriminação não são comportamentos a ter em sociedade. Quando chegamos à fase adulta, temos valores éticos e morais assentes, seguimos as regras e as leis que nos impõem e, de forma mais ou menos clara, sabemos perfeitamente fazer a distinção entre o bem e o mal.

Isso não quer dizer, no entanto, que não adoremos ver filmes onde os maus levam no pelo, onde o bufo "tem aquilo que merece" e onde aquele que nos falta ao respeito acaba com um olho negro. A psicologia talvez explique o fascínio que alguns têm com o mundo da máfia; para nós, que não temos estudos na área, é simplesmente cool. E sim, sabemos que os comportamentos retratados nesses filmes estão errados e que, como nos diziam quando éramos putos, "isso não se faz".

E, ainda assim, continuamos a gostar que nos entretenham com estas histórias, algumas delas baseadas em factos reais. É claro que, na grande maioria das vezes, referimo-nos à máfia ítalo-americana ou russo-americana, a máfia "civilizada", aquela que emigrou para a maior potência mundial à procura de novas oportunidades.

Foi nesse contexto que nasceu o primeiro Mafia, lançado em 2002, o qual rapidamente atingiu um grau de excelência dentro dos jogos do género e não só. Os gráficos contavam com algumas texturas de topo para a altura, a história era sólida e envolvente, não se registavam muitos erros na parte técnica e, no geral, era um jogo que fazia justiça ao imaginário que temos sobre os gangsters e "la famiglia".

Oito anos depois, a 2K Czech (antiga Illusion Softworks) lança Mafia 2. Passado entre 1943 e 1951, alguns anos depois do fim do primeiro jogo, este conta a história de Vito Scaletta, um veterano da Segunda Guerra Mundial (que, curiosamente, foi obrigado a alistar-se devido a actos delinquentes) que se vê cada vez mais entranhado numa vida de crime. Tommy Angelo, o protagonista de Mafia, aceitou juntar-se à família Salieri quase contrariado; Scaletta entra no submundo de Empire Bay com plena consciência de onde se está a meter, embora tenha dúvidas a início.

Quem jogou ao lado de Salieri, Paulie, Sam, Frank ou Vincenzo, vai ter alguma dificuldade em aceitar Joe, Henry ou Leo, algumas das personagens que Vito irá acompanhar. Não quer isto dizer que a história de Mafia 2 não seja boa por mérito próprio, muito pelo contrário, mas os nosso companheiros parecem não ter o mesmo carisma.

Ainda assim, o enredo está bem estruturado. Em Empire Bay - uma junção de Nova Iorque e São Francisco - existem três famílias criminosas: a Clemente, a Falcone e a Vinci. O percurso de Vito passará pelas três, num total de 15 capítulos de história, que durarão cerca de 12 horas a completar. A longevidade é um ponto negativo, que poderia ter sido colmatado com mais personagens que fornecessem missões secundárias. Ainda assim, o tempo que temos com Mafia 2 não é mal passado.

Em termos técnicos, a série evoluiu (e mal estaria se não o fizesse). O sistema de condução foi melhorado; os carros sofrem danos, deixam as marcas dos pneus no chão e até existem oficinas onde podemos alterar a cor, as jantes, o motor ou até a matrícula do veículo, de forma a legalizarmos um carro que tenhamos roubado.

Vito pode, agora, comprar nova roupa, comer e beber (para regenerar a vida que perdeu) ou guardar os seus carros favoritos numa garagem com capacidade para 20 veículos. Se estiver longe de casa, pode escolher assaltar um carro alheio, utilizando um lockpick ou simplesmente partindo a janela. E se a polícia o vir, pode sempre despistá-los e fazer um telefonema rápido para a esquadra, de forma a acalmar a situação.

São estes pequenos pormenores que tornam Mafia 2 numa experiência gratificante. Da mesma forma, existem três estações de rádio que ajudam a criar ambiente. Fiquei com a impressão que a música se adapta à medida que o tempo passa, acompanhando o ano em que nos encontramos nesse momento. De qualquer das formas, obrigado, 2K Czech, pela inclusão da Sing, Sing, Sing, de Louis Prima.

Há duas grandes adições neste segundo capítulo: o sistema de luta e o sistema de cobertura. Não são sistemas extremamente avançados, e já vimos melhores em outros jogos, mas pelo menos são funcionais e não envergonham.

Para a luta corpo-a-corpo, Vito tem disponíveis murros fracos e murros fortes, podendo ainda desviar-se de ataques inimigos e contra-atacar. No fim, pode também acabar o combate com um finishing move típico des filmes de gangsters (em bom português, com uma biqueirada nos dentes). Contudo, visto que este sistema de luta segue as personagens através de uma espécie de lock, poderão existir eventuais problemas com a câmara, especialmente quando estamos perto de uma parede ou outro obstáculo.

O cover system foi uma boa implementação, assim como a possibilidade de carregarmos várias armas do mesmo género. Podemos chegar a ter dois revólveres, duas armas semi-automáticas (seja bem aparecida, Colt 1911), uma Tommy Gun e uma caçadeira, o que nos dá poder de fogo suficiente para manter uma batalha campal acesa durante algum tempo. Aqui não temos um sistema de lock explícito, embora se note que o jogo nos ajuda a apontar a arma para o sítio certo, especialmente quando estamos encostados a uma parede, por exemplo.

Outro detalhe interessante é o peso dos avanços tecnológicos. Em Mafia 2, os carros são, naturalmente, mais modernos do que eram no primeiro jogo, e Vito chega a usar, a certa altura, uma pistola de carregador estendido.

Em termos visuais, os gráficos estão dentro dos padrões actuais, embora não nos deixem espantados. Algumas texturas podiam ter sido melhoradas, mas as expressões faciais estão boas. No campo do som, o trabalho de voz está excelente e a música está perfeitamente adequada ao jogo. Os restantes efeitos, como o som das armas, das travagens bruscas ou dos embates, estão aceitáveis.

Mafia 2 é divertido e conta com pormenores que não o deixam ser um mau jogo, mas precisava de algo mais para ser um título excelente. É uma boa história de gangsters, que agradará aos amantes do género mas que fará hesitar os restantes. Os tempos de hoje são mais competitivos do que eram em 2002, e Mafia 2 não nos consegue marcar tanto como Mafia nos marcou na altura. Basicamente, it’s not an offer you can’t refuse.

Algumas imagens: